História da Igreja
26 Todas as coisas ruins da guerra


Capítulo 26

Todas as coisas ruins da guerra

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bombardeiros nazistas enchem o céu

Em 24 de agosto de 1939, oito dias antes da invasão da Polônia, a Primeira Presidência ordenou que 320 missionários norte-americanos nas Missões Britânica, Francesa, Alemã Ocidental, Alemã Oriental e Checoslovaca fossem encaminhados para Dinamarca, Suécia, Noruega ou Holanda — qualquer país neutro que estivesse mais próximo.1 O apóstolo Joseph Fielding Smith, que visitara os santos na Europa naquele verão com sua esposa, Jessie, ficou na Dinamarca para coordenar a saída de Copenhague.2

Depois de receber a ordem para partir, Norman Seibold, um missionário de 23 anos de Idaho que servia na Missão da Alemanha Ocidental, providenciou para que todos os missionários norte-americanos em seu distrito deixassem o país imediatamente. Então, em vez de ir direto para a Holanda, ele foi para a casa da missão em Frankfurt.

Quando chegou, Norman encontrou seu presidente de missão, Douglas Wood, doente em decorrência de sua preocupação. O presidente Wood enviara telegramas instruindo todos os missionários a sair do país, mas as linhas de comunicação em toda a Alemanha estavam sobrecarregadas. Apenas Norman e alguns missionários confirmaram o recebimento da mensagem. E, para piorar as coisas, funcionários do governo da Holanda proibiam de entrar no país quaisquer pessoas que não fossem cidadãos holandeses, a menos que estivessem apenas de passagem. Agora, dezenas de missionários provavelmente estavam parados no oeste da Alemanha com passagens inúteis de trem para a Holanda e sem dinheiro para comprar outras passagens.3

O presidente Wood e sua esposa, Evelyn, estavam indo supervisionar a saída de um grupo de élderes que já havia chegado à casa da missão e precisava de alguém para ficar na Alemanha a fim de localizar os missionários restantes.

“Será sua missão encontrá-los e fazer com que eles escapem”, disse o presidente Wood a Norman. “Siga totalmente a inspiração que receber. Não temos ideia em que cidades esses 31 élderes estão.”4

Mais tarde naquela noite, Norman deixou Frankfurt em um trem lotado, rumo ao norte, ao longo do rio Reno. Ele tinha passagens para a Dinamarca e dinheiro para ajudar qualquer missionário que encontrasse — se ao menos soubesse onde encontrá-los. E ele precisava se apressar. O governo alemão acabara de anunciar que os militares precisavam das ferrovias para transportar soldados, de modo que os assentos logo seriam escassos para qualquer civil viajando de trem.

Quando o trem parou na cidade de Colônia, Norman sentiu que deveria sair e abriu caminho para fora do vagão. A estação estava apinhada de gente, então ele subiu em um carrinho de bagagem para ver por cima da multidão. Porém, não reconheceu nenhum missionário. Então, ele se lembrou do “assobio missionário” — a melodia do hino “Faze o bem”, que era familiar a todos na missão. Norman tinha pouco talento para a música, mas apertou os lábios e assobiou o melhor que pôde as primeiras notas.5

As pessoas imediatamente notaram, e logo Norman viu um missionário e um membro alemão local vindo em sua direção. Ele continuou a assobiar, e mais élderes e um casal de missionários mais velhos também o encontraram. Ele mandou os missionários para um local seguro e depois embarcou em um trem para outra cidade.

Poucas horas depois, na cidade de Emmerich, Norman encontrou mais missionários. Enquanto lhes entregava o dinheiro do presidente da missão, ele atraiu a atenção de um policial, que parecia pensar que os missionários estavam contrabandeando dinheiro para fora da Alemanha. O policial exigiu que entregassem o dinheiro e lhe contassem o que estavam fazendo. Quando Norman se recusou a cooperar, o policial o agarrou e ameaçou levá-lo às autoridades municipais.

Norman geralmente obedecia à polícia, mas não queria ir com o policial para a cidade. “É melhor você me soltar”, disse ele, “ou pode haver uma briga”.

A essa altura, uma multidão havia se formado, e o policial olhou para as pessoas nervosamente. Ele soltou Norman e o levou a um oficial militar na estação de trem para lhe explicar quem era e o que estava fazendo. O oficial ouviu a história de Norman, não viu motivo para detê-lo e até escreveu uma carta de explicação para que ele mostrasse a qualquer pessoa que pudesse impedi-lo durante suas viagens.6

Norman continuou, parando para procurar missionários sempre que o Espírito o orientava. Em uma cidade remota, quase ninguém estava parado na plataforma da ferrovia, e parecia bobagem procurar missionários ali. Mas Norman sentiu que precisava descer do trem, então decidiu ir para a cidade. Ele logo chegou a um pequeno restaurante e encontrou dois élderes bebendo suco de maçã comprado com as últimas moedas em seu bolso.7

Depois de dias de busca, Norman localizou 17 missionários. Para chegar à Dinamarca, ele e seus companheiros tiveram que pegar trens requisitados para o transporte de tropas, enganando os condutores de trem e evitando os policiais durante todo o trajeto. Quando Norman chegou a Copenhague, um dia após a invasão da Polônia, todos os missionários norte-americanos nas missões alemãs estavam seguros.

No dia seguinte, 3 de setembro, a França e a Grã-Bretanha declararam guerra à Alemanha.8


“A guerra ameaçada e temida estourou”, anunciou o presidente Heber J. Grant na Conferência Geral de Outubro de 1939. Durante anos, ele assistira com alarme e apreensão enquanto Hitler conduzia a Alemanha por um caminho violento e perigoso, desencadeando miséria e derramamento de sangue pelo mundo. Agora as potências do Eixo, lideradas pela Alemanha nazista, estavam travando combate com as nações dos Aliados, sob a liderança do Reino Unido e da França.

“Deus Se entristece com a guerra”, disse o presidente Grant aos santos. “Ele sujeitará às punições eternas de Sua vontade aqueles que a praticarem injustamente.” O profeta exortou os líderes do mundo, e todas as pessoas em todos os lugares, a buscar soluções pacíficas para suas diferenças.

“Condenamos todas as coisas ruins da guerra — avareza, ganância, miséria, carência, doença, crueldade, ódio, desumanidade, selvageria, morte”, ele declarou. O profeta se entristecia ao pensar nos milhões de pessoas sofrendo e chorando por causa do conflito. Milhares deles eram santos dos últimos dias, e alguns já estavam em perigo. Ele disse: “Pedimos encarecidamente a todos os membros da Igreja que amem seus irmãos e suas irmãs. Conclamamos igualmente todos os povos, onde quer que estejam, a banir o ódio de sua vida, a encher o coração de caridade, paciência, longanimidade e perdão”.9

Nas semanas e nos meses após a conferência geral, a guerra não saía da mente e dos pensamentos do profeta. Em dezembro, ele escreveu à sua filha Rachel sobre as perdas desnecessárias de vidas. “Meu coração se enche de dor”, escreveu ele. “Penso que o Senhor deveria eliminar da Terra as pessoas que criam e iniciam guerras, como Hitler.”10

No inverno de 1940, o presidente Grant viajou para Inglewood, um bairro em Los Angeles, onde os santos ansiavam por ouvi-lo em sua conferência de estaca. Ao chegar à capela, sentiu tontura e teve dificuldade em falar. Quando saiu do carro, suas pernas estavam bambas, e ele fez um grande esforço para caminhar até a porta da capela. A tontura parecia ter passado logo depois que se sentou ao púlpito. Ainda assim, ele pediu desculpas por não se sentir bem para dar sua mensagem.

Mais tarde, depois de uma soneca, ele se sentiu forte o suficiente para falar na sessão da tarde da conferência. De pé ao púlpito, ele se dirigiu aos santos por quase 40 minutos. Mas, naquela noite, quando quis se levantar várias vezes, quase caiu. Na manhã seguinte, seu lado esquerdo estava dormente e ele não conseguia levantar o braço ou mover os dedos daquele lado. Quando tentou se levantar, sua perna esquerda não tinha forças. Sua língua parecia pesada, e as palavras se misturavam quando ele falava.

Com a ajuda de familiares e de amigos, o presidente Grant foi levado a um hospital próximo, onde os médicos descobriram que ele havia sofrido um derrame.11 Ele passou os meses seguintes na Califórnia, lentamente recuperando sua força e seu movimento. Seu médico o aconselhou a descansar mais, comer melhor e evitar qualquer atividade extenuante. Em abril, o profeta estava bem o suficiente para voltar a Salt Lake City.

“Tenho me sentido bem e preguiçoso ao seguir as instruções do médico”, informou ele à filha Grace logo após seu retorno. “Não sei por quanto tempo vou aguentar.”12


Em 28 de junho de 1940, a guerra na Europa estava longe da mente dos santos em Cincinnati, Ohio. Naquela noite, Connie Taylor, de 21 anos, ouviu as primeiras notas da “Marcha Nupcial”, de Wagner, sua deixa para começar a andar pelo corredor da capela do Ramo Cincinnati. A capela estava repleta de familiares e amigos, todos reunidos para celebrar seu casamento com Paul Bang.13

Connie e Paul ficaram noivos há pouco mais de um ano. Eles queriam ser selados, mas, como muitos casais santos dos últimos dias que moravam longe de um templo, eles decidiram primeiro se casar no civil na capela da Igreja.14

Enquanto caminhava para a frente da capela, Connie viu seu pai sentado entre os convidados. Nos casamentos nos Estados Unidos, tradicionalmente o pai leva a filha até o altar. Mas, como seu pai tinha dificuldade para andar, seu irmão Milton caminhou com ela. Connie estava muito feliz por seu pai estar ali. Em sua bênção patriarcal, havia uma promessa de que ele um dia desfrutaria das bênçãos do evangelho com ela. Esse dia ainda não havia chegado, mas certa vez ele assistira a uma reunião sacramental num domingo de Páscoa, e isso era um bom sinal.15

Depois que Connie se juntou a Paul na frente da capela, o presidente do ramo, Alvin Gilliam, realizou a cerimônia. Para muitas pessoas na sala, a noite marcava o fim de uma era. Além das reuniões do próximo domingo, o casamento seria a última vez que o Ramo Cincinnati se reuniria na pequena capela comprada há 11 anos. O antigo prédio estava desmoronando e fora vendido recentemente pelo ramo, que comprara um terreno ao norte da cidade para construir uma nova capela.16

Os recém-casados partiram na tarde do dia seguinte para as Cataratas do Niágara, Nova York, no caminhão do pai de Paul. Eles levaram três cestas de alimentos do armazém da família, algumas roupas e cerca de 60 dólares em dinheiro.

No caminho, Connie e Paul visitaram o Templo de Kirtland. O edifício agora era usado como capela pela Igreja Reorganizada de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. A porta do templo estava trancada quando eles chegaram, mas um homem com uma chave abriu o prédio e os deixou passar uma hora visitando-o por conta própria. Eles exploraram cada centímetro do templo, inclusive a torre, de onde avistaram a pequena vila onde centenas de santos fiéis viveram há mais de um século.17

De Kirtland, eles seguiram para as Cataratas do Niágara. A cidade turística era um destino popular para lua de mel na fronteira dos Estados Unidos com o Canadá, mas a guerra na Europa havia colocado todos em alerta. Embora os Estados Unidos não tivessem entrado no conflito, o Canadá fazia parte da Comunidade Britânica e declarara guerra à Alemanha após a invasão da Polônia. Antes que Connie e Paul pudessem cruzar para o Canadá, eles foram revistados minuciosamente pelos inspetores de fronteira para se certificarem de que não eram espiões.

Depois de fazer um tour pelas Cataratas do Niágara, o casal dirigiu 160 quilômetros para o leste até Palmyra e Manchester, em Nova York.18 Ao longo dos anos, a Igreja adquirira vários locais históricos na área, inclusive o Monte Cumora, o Bosque Sagrado e a casa de madeira de Lucy e Joseph Smith Sr. Reconhecendo o potencial desses locais para o trabalho missionário, a Igreja começou a abri-los aos visitantes, anunciando seu significado histórico e espiritual em placas de beira de estrada. No início da década de 1920, sob a direção de B. H. Roberts, conferências de missões foram realizadas no Monte Cumora e, desde aquela época, todos os anos acontece uma apresentação teatral ao ar livre aberta ao público.19

Enquanto estavam em Manchester, Connie e Paul pagaram uma pequena taxa para passar a noite na casa da família Smith. Eles subiram o Monte Cumora e pensaram nas placas de ouro que ficaram enterradas lá por tanto tempo. No topo da colina, havia um novo monumento do anjo Morôni, e eles pararam para tirar fotos dele e apreciar a vista magnífica da área ao redor. Posteriormente, caminharam pelo Bosque Sagrado, apreciando a santidade e a beleza do lugar. Antes de sair, eles se ajoelharam para oferecer uma oração.20

Os recém-casados fizeram uma breve visita a Washington, D.C., onde assistiram a uma reunião em uma enorme capela de mármore que a Igreja havia dedicado em 1933. A Igreja experimentou um crescimento significativo na cidade desde 1920, quando o apóstolo Reed Smoot e um pequeno grupo de santos organizaram um ramo ali. Na verdade, pouco antes da visita de Paul e Connie, o apóstolo Rudger Clawson organizara uma estaca em Washington, chamando Ezra Taft Benson, de 40 anos, como presidente.21

Depois de alguns dias em Washington, Connie e Paul voltaram para Cincinnati, onde se estabeleceram em um apartamento bem arejado, não muito longe da mercearia da família Bang. Eles gastaram na lua de mel todo o dinheiro que possuíam, mas Paul ainda tinha um emprego com o pai. Em alguns anos, depois de economizar algum dinheiro, eles puderam fazer uma viagem ainda mais longa — desta vez para Salt Lake City e o templo.22


Em uma noite fria de dezembro de 1940, o zumbido ameaçador dos aviões bombardeiros nazistas encheu o céu de Cheltenham, uma cidade no sudoeste da Inglaterra. Por seis meses, a força aérea alemã, a Luftwaffe, vinha bombardeando a Grã-Bretanha com incessantes ataques aéreos. Os ataques se concentraram primeiro em bases aéreas e portos, mas depois passaram a visar áreas civis em Londres e seu entorno.23 Cheltenham era um lugar tranquilo, com belos parques e jardins. Mas agora era um alvo.

Nellie Middleton, um membro da Igreja com 55 anos, vivia na cidade, com sua filha Jennifer, de 6 anos. A fim de preparar seu lar contra os ataques aéreos, ela usou seu modesto salário de costureira para transformar uma área de seu porão em um abrigo, com alimentos, água, lamparinas e uma pequena cama de ferro para Jennifer. Seguindo as instruções do governo, Nellie também cobria suas janelas com telas para conter os estilhaços de vidro em caso de um ataque.24

Agora, por toda a cidade, era possível ouvir o silvo das bombas no ar e o barulho como de um trovão quando atingiam o solo. O terrível barulho ficou mais alto e mais próximo da casa de Nellie, até que uma enorme explosão em uma rua próxima à sua sacudiu as paredes da casa, quebrando as janelas e enchendo as telas com estilhaços afiados de vidro.

De manhã, as ruas da cidade estavam repletas de escombros. As bombas mataram 23 pessoas e deixaram mais de 600 desabrigadas.25

Nellie e outros membros da Igreja de Cheltenham deram seu melhor para seguir em frente após o ataque. Quando o presidente da Missão Britânica, Hugh B. Brown, e outros missionários americanos deixaram o país um ano antes, pequenos ramos como o de Cheltenham tiveram dificuldades para preencher os chamados e dirigir os programas da Igreja. Posteriormente, os homens da cidade foram enviados para a guerra, e não restara qualquer portador do sacerdócio para abençoar o sacramento ou administrar formalmente os assuntos do ramo. Não muito tempo depois, o ramo foi forçado a se dissolver.

Um homem mais velho chamado Arthur Fletcher, que portava o Sacerdócio de Melquisedeque, morava a aproximadamente 32 quilômetros dali; ele usava sua velha bicicleta para visitar os santos de Cheltenham sempre que podia. Mas, na maior parte do tempo, foi Nellie, a ex-presidente da Sociedade de Socorro do Ramo Cheltenham, quem tomou sobre si a responsabilidade pelo bem-estar temporal e espiritual dos membros em sua área. Com o ramo fechado, os membros da Igreja não podiam mais se reunir no saguão alugado que usavam aos domingos. Por isso, a sala de estar de Nellie se tonou o lugar onde as mulheres da Sociedade de Socorro oravam, cantavam e estudavam juntas Jesus, o Cristo e Regras de Fé.26

Nellie também se assegurou de que sua filha aprendesse o evangelho. Ela tinha quase 50 anos e era solteira quando adotou Jennifer. Agora, a menina se juntava às mulheres quando se reuniam para estudar, e elas tomavam o cuidado de falar sobre o evangelho de uma maneira que Jennifer pudesse entender. Nellie e outras irmãs da Sociedade de Socorro também levavam Jennifer quando visitavam os enfermos ou idosos. Ninguém no ramo tinha telefone ou carro, então elas faziam as visitas a pé, levando um pote de geleia ou um pedaço de bolo com uma mensagem.27

Mas todas as visitas cessavam quando anoitecia. Para dificultar a visão de seus alvos aos pilotos de ataque aéreo alemães, as vilas e as cidades em todo o Reino Unido desligavam as luzes das ruas e dos letreiros. As pessoas cobriam as janelas com um pano escuro e desatarraxavam as lâmpadas das entradas das casas.

Em Cheltenham, os santos se refugiavam em suas casas. Qualquer brilho de luz poderia colocar eles e seus vizinhos em risco.28


No ano seguinte, o presidente do Ramo Viena, Alois Cziep, estava achando cada vez mais difícil cumprir seu chamado. A guerra havia cortado os canais usuais de comunicação entre a sede da Igreja e os ramos nas áreas ocupadas pelo Eixo. Der Stern, a revista em alemão da missão, parou de ser publicada. O presidente interino da missão, um membro alemão chamado Christian Heck, estava fazendo o possível para manter a Igreja funcionando em meio ao caos. Alois fazia o mesmo por seu ramo.

Embora a destruição física e a devastação da guerra ainda não tivessem alcançado as fronteiras da Áustria, Alois sabia que a Força Aérea Real Britânica havia atacado cidades alemãs. A União Soviética também estava em guerra com o Terceiro Reich. Como a Grã-Bretanha do outro lado do conflito, a Áustria também estava sob ordens de blecaute noturno para se proteger contra aeronaves inimigas que poderiam sobrevoar a área.29

A maioria dos homens do Ramo Viena havia sido convocada para o exército alemão quando a guerra começou. Como Alois havia perdido um olho devido a uma doença alguns anos antes, ele estava isento do serviço militar. E, apesar dos desafios crescentes, ele tinha a sorte de contar com a ajuda de dois conselheiros, vários jovens portadores do Sacerdócio Aarônico e sua esposa, Hermine. Como presidente da Sociedade de Socorro, Hermine carregava grande parte do fardo emocional das mulheres do ramo, que muitas vezes se sentiam oprimidas, solitárias e com medo — especialmente se recebiam notícias de que seus entes queridos haviam sido feitos prisioneiros ou mortos em batalha.

Hermine as incentivava a confiar em Deus e seguir em frente, e ela procurava fazer o mesmo.30

Mesmo quando o ramo ficou menor após o início da guerra, as diferenças de opinião entre seus membros continuaram apesar dos esforços de Alois para manter a política longe das reuniões. Certa vez, no início de uma reunião da Igreja, um visitante da Alemanha fez uma oração a favor de Adolf Hitler. “Irmão”, disse Alois depois que o homem terminou, “neste lugar não oramos por Hitler”.

Com membros do Partido Nazista e simpatizantes no ramo, Alois muitas vezes precisava ser cuidadoso com o que dizia. Informantes e espiões poderiam estar em qualquer lugar, prontos para denunciá-lo e sua família ao governo. Embora ele e Hermine acreditassem em respeitar as leis do país, às vezes era doloroso.31

Dois membros do ramo, Olga Weiss e seu filho adulto Egon, eram conversos judeus que serviam no ramo todas as semanas com seus talentos musicais. Mas, quando os nazistas invadiram a Áustria, a família Weiss sabia que eles tinham que deixar o país ou se arriscariam a ser vítimas do violento antissemitismo do regime. Embora a família não praticasse mais o judaísmo, os nazistas os consideravam “racialmente judeus” por causa de sua ancestralidade.

Alguns meses depois da anexação da Áustria pela Alemanha, a família Weiss escreveu cartas urgentes para a Primeira Presidência e ex-missionários que conheciam, na esperança de encontrar alguém que pudesse ajudá-los e alguns de seus parentes a emigrar para os Estados Unidos. “As condições aqui são terríveis para nós, judeus”, escreveu Egon em sua carta. “Precisamos fugir daqui.”32

Como muitas pessoas em todo o mundo, o presidente Grant havia recebido relatórios conflitantes sobre a hostilidade de Hitler para com os judeus e a extensão do perigo que eles enfrentavam na Alemanha. O profeta havia denunciado tal antissemitismo publicamente e em particular.33 Mesmo assim, os líderes da Igreja não conseguiam ajudar a família Weiss nem qualquer outro indivíduo europeu que desejava emigrar. A lei dos Estados Unidos, eles observaram, não permitia mais que organizações religiosas patrocinassem imigrantes, e por muitos anos a Igreja recusou todos os pedidos para esse tipo de assistência.34 À medida que a guerra na Europa aumentava, a Primeira Presidência frequentemente expressava consternação porque o governo americano não permitia que eles ajudassem os refugiados migrantes. Quando o presidente Grant e seus conselheiros recebiam cartas como a de Egon, o que podiam fazer era responder com simpatia, às vezes recomendando organizações que eles esperavam ser capazes de ajudar. 35

Em setembro de 1941, Egon e Olga ainda estavam em Viena. Naquela época, os nazistas exigiam que todos os judeus austríacos se identificassem usando uma estrela de Davi amarela em suas roupas. Quando as autoridades nazistas descobriram que judeus frequentavam às reuniões no Ramo Viena, ordenaram que Alois os proibisse de comparecer. Se ele se recusasse, os santos seriam despejados de seu local de reunião.

Alois decidiu que precisava atender à demanda. Em conflito e cheio de pesar, ele se encontrou com a família Weiss e disse-lhes que eles não podiam mais frequentar as reuniões. Mas ele e outros membros do ramo continuaram a visitar a família fielmente — até que, um dia, Olga e Egon não foram mais encontrados em lugar algum.36

  1. Primeira Presidência para Douglas Wood, telegrama, 24 de agosto de 1939; Primeira Presidência para Joseph Fielding Smith, telegramas, 24 de agosto de 1939; 25 de agosto de 1939, Arquivos da missão da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja; Departamento de Estado dos Estados Unidos, memorando, 25 de agosto de 1939, correspondência do Departamento de Estado dos Estados Unidos a respeito dos mórmons e do mormonismo, Biblioteca de História da Igreja; Grant, diário, 27 de agosto de 1939; Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, pp. 123, 136; ver também Minert, Under the Gun, pp. 27–28; e Missão Britânica, história manuscrita e relatórios históricos, 1º–2 de setembro de 1939. Os missionários na Missão Britânica foram enviados diretamente para os Estados Unidos.

  2. Joseph Fielding Smith para a Primeira Presidência, 6 de maio de 1939; 1º de agosto de 1939; Joseph Fielding Smith e Jessie Evans Smith para Heber J. Grant, 21 de junho de 1939, correspondências diversas da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja; Joseph Fielding Smith para a Primeira Presidência, 28 de agosto de 1939, arquivos da missão da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja.

  3. Seibold, entrevista de história oral, pp. 2–3; Douglas Wood, em One Hundred Tenth Annual Conference, pp. 78–79; Joseph Fielding Smith para a Primeira Presidência, telegrama, 26 de agosto de 1939, arquivos da missão da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja; Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, p. 137.

  4. Douglas Wood, em One Hundred Tenth Annual Conference, pp. 79–81; Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, p. 143.  

  5. Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, p. 144; Douglas Wood, em One Hundred Tenth Annual Conference, pp. 79–80; Seibold, entrevista de história oral, pp. 3, 12; Montague, Mormon Missionary Evacuation, p. 83.

  6. Seibold, entrevista de história oral, pp. 4–5, 12; Montague, Mormon Missionary Evacuation, pp. 84–86; Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, p. 144.  

  7. Seibold, entrevista de história oral, p. 6.

  8. Boone, “Evacuation of the Czechoslovak and German Missions”, p. 146; Seibold, entrevista de história oral, p. 10; Montague, Mormon Missionary Evacuation, pp. 97–100; Overy, Third Reich, pp. 197–198; Ellis Rasmussen e John Kest, “Border Incident”, Improvement Era, dezembro de 1943, vol. 46, pp. 793797. Tópico: Segunda Guerra Mundial.

  9. Heber J. Grant, em One Hundred Tenth Semi-annual Conference, pp. 8–9; Heber J. Grant para Walter Day, 8 de setembro de 1939, Letterpress Copybook, vol. 78, p. 99, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja.

  10. Grant, diário, 6 de dezembro de 1939; Heber J. Grant para Rachel Grant Taylor, 14 de dezembro de 1939, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja.

  11. Grant, diário, 4–5 de fevereiro de 1940; Heber J. Grant para Charles Zimmerman, 20 de junho de 1940, Letterpress Copybook, vol. 79, p. 61, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja; Clark, diário do escritório, 5 de fevereiro de 1940; Heber J. Grant para Isaac Stewart, 10 de maio de 1940, Letterpress Copybook, vol. 78, p. 962; Heber J. Grant para Henry Link, 2 de agosto de 1941, Letterpress Copybook, vol. 80, p. 230, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja.

  12. Grant, diário, 27 de abril de 1940; Heber J. Grant para Grace Grant Evans, 1º de maio de 1940; Willard Smith para “Família ‘Grant’”, 22 de fevereiro de 1940, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja. Tópico: Heber J. Grant.

  13. Bang, autobiografia, pp. 7–8; Bang, história do dia do casamento, p. 1.

  14. Paul Bang, “My Life Story”, pp. 22, 27; ver também Charles Anderson para Adeline Yarish Taylor, 30 de julho de 1940, documentos de Paul e Cornelia T. Bang, Biblioteca de História da Igreja.

  15. Bang, autobiografia, p. 7; Cornelia Taylor, bênção patriarcal, 6 de fevereiro de 1935, pp. 1–2, documentos de Paul e Cornelia T. Bang, Biblioteca de História da Igreja; Taylor, diário, 12 de abril de 1936.

  16. Bang, autobiografia, pp. 7–8; Leo Muir para o Bispado Presidente, 15 de abril de 1940; Marvin O. Ashton, memorando, 22 de maio de 1940, arquivos gerais do Bispado Presidente, 1889–1956, Biblioteca de História da Igreja; Fish, Kramer e Wallis, History of the Mormon Church in Cincinnati, p. 67.

  17. Tópicos: Templo de Kirtland; Outros movimentos santos dos últimos dias.

  18. Bang, história do dia do casamento, p. 1; Bang, diário da lua de mel, pp. 23–24; Howlett, Kirtland Temple, pp. 53–56, 60–61; Bang, “Personal History of Paul and Connie Bang—1942 Forward”, pp. 2–3.

  19. Lund, “Joseph F. Smith and the Origins of the Church Historic Sites Program”, pp. 345, 352–355; Packer, “Study of the Hill Cumorah”, pp. 75, 92–94, 122–126, 135–138; Argetsinger, “Hill Cumorah Pageant”, pp. 58–59. Tópicos: Locais históricos da Igreja; Palmyra e Manchester; O Bosque Sagrado e a fazenda da família Smith.

  20. Bang, diário da lua de mel, p. 25; Bang, “Personal History of Paul and Connie Bang—1942 Forward”, p. 3; Gerritsen, “Hill Cumorah Monument”, p. 133; Paul Bang e Cornelia Taylor Bang, Monte Cumora, 1940, fotografia, documentos de Paul e Cornelia T. Bang, Biblioteca de História da Igreja.

  21. Bang, diário da lua de mel, p. 25; “Leaders in Church Speak at Opening of Capital Chapel”, Deseret News, 11 de novembro de 1933, seção da Igreja, p. 1; “Will Link Parks by One Great Highway”, Deseret Evening News, 5 de junho de 1920, seções 2, 8; “Church Forms Stakes in U.S. Capital and Denver”, Deseret News, 1º de julho de 1940, p. 11.

  22. Bang, diário da lua de mel, pp. 25–26; Bang, “Personal History of Paul and Connie Bang—1942 Forward”, pp. 3–5; Williams’ Cincinnati City Directory, p. 70.

  23. Ministério da Aeronáutica do Reino Unido, Daily Weather Report, Ross-on-Wye, 11 de dezembro de 1940; “Victims Trapped in Wrecked Homes”, Cheltenham (England) Chronicle and Gloucestershire Graphic, 14 de dezembro de 1940, p. 2; Overy, Third Reich, pp. 224–230; Donnelly, Britain in the Second World War, pp. 92–93. Tópico: Inglaterra.

  24. Jennifer Middleton Mason, “Sisters of Cheltenham”, Ensign, outubro de 1996, pp. 59–60; Mason, entrevista de história oral, pp. 4–7, 9–10, 17–18.

  25. “Victims Trapped in Wrecked Homes”, Cheltenham (England) Chronicle and Gloucestershire Graphic, 14 de dezembro de 1940, p. 2; Elder, Secret Cheltenham, p. 55; Mason, entrevista de história oral, p. 16; Hasted, Cheltenham Book of Days, p. 347; “Over 600 Homeless after Raid”, Cheltenham Chronicle and Gloucestershire Graphic, 21 de dezembro de 1940, p. 3.

  26. Missão Britânica, história manuscrita e relatórios históricos, 1º–2 de setembro de 1939; 10 e 18 de janeiro de 1940; Jennifer Middleton Mason, “Sisters of Cheltenham”, Ensign, outubro de 1996, p. 59; Mason, entrevista de história oral, pp. 10–12, 21, 26–27; anotação de Arthur Fletcher, Ramo Stroud, Distrito de Bristol, Missão Britânica, nº 11, em Inglaterra (país), parte 42, coleção de registro de membros, Biblioteca de História da Igreja.

  27. Mason, entrevista de história oral, pp. 4–6, 13–14, 22, 24; Jennifer Middleton Mason, “Sisters of Cheltenham”, Ensign, outubro de 1996, p. 59.

  28. “Air Raid Danger, Warning Signals, and Blackout Instructions”, arquivo MEPO-4-489; Jennifer Middleton Mason, “Sisters of Cheltenham”, Ensign, outubro de 1996, p. 59; Mason, entrevista de história oral, p. 14.

  29. Collette, Collette Family History, p. 205; Scharffs, Mormonism in Germany, p. 107; Minert, Under the Gun, pp. 17, 465; Collette, Collette Family History, p. 210; Bukey, Hitler’s Austria, pp. 188, 196–200, 206.

  30. Minert, Under the Gun, pp. 463, 474; Hatch, Cziep Family History, pp. 31, 64, 81, 202–203.

  31. Hatch, Cziep Family History, p. 81; Collette, Collette Family History, pp. 171–172.

  32. Hatch, Cziep Family History, p. 81; Botz, “Jews of Vienna”, pp. 321–322; 330, nota 49; Egon Weiss para “Prezado irmão”, 23 de novembro de 1938, correspondências diversas da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja.

  33. Tobler, “Jews, the Mormons, and the Holocaust”, p. 81; Heber J. Grant, em Ninety-First Annual Conference, p. 124; Heber J. Grant para Willard Smith, 24 de junho de 1933, Letterpress Copybook, vol. 70, p. 788; Heber J. Grant para Wesley King, 24 de janeiro de 1920, Letterpress Copybook, vol. 55, p. 515, Heber J. Grant Collection, Biblioteca de História da Igreja.

  34. Tobler, “Jews, the Mormons, and the Holocaust”, p. 81; Egon Weiss para “Prezado irmão”, 23 de novembro de 1938; Primeira Presidência para “Mrs. A. Goddard”, 23 de novembro de 1920; Heber J. Grant para S. Sipkema, 29 de janeiro de 1926; Heber J. Grant, Anthony W. Ivins e Charles W. Nibley para Cornelia van der Meide, 29 de janeiro de 1930, correspondências diversas da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja; ver também Jensen e Javadi-Evans, “Senator Elbert D. Thomas”, pp. 223–239. Tópico: Emigração.

  35. Ver, por exemplo, Joseph Anderson para Paula Stemmer, 13 de outubro de 1938; Joseph Anderson para Max Safran, 7 de novembro de 1938; e J. Reuben Clark Jr. e David O. McKay para Richard Siebenschein, 27 de janeiro de 1939, correspondências diversas da Primeira Presidência, Biblioteca de História da Igreja.

  36. Botz, “Jews of Vienna”, p. 330; Hatch, Cziep Family History, pp. 81, 200, 202; ver também Tobler, “Jews, the Mormons, and the Holocaust”, pp. 85–86.