1990–1999
O Perdão Divino
October 1993


O Perdão Divino

O início e o fim do arrependimento que leva ao perdão é a fé em Jesus Cristo, que é o autor e o aperfeiçoador de nossa fé.

O Salvador do mundo, o Redentor de todos os filhos de Deus, Jesus de Nazaré, tem poder de perdoar pecados. Seu próprio testemunho sobre tal poder encontra-se registrado no Novo Testamento (vide Mateus 9:6; Marcos 2:10; Lucas 5:20, 24). Seus Apóstolos Pedro e Paulo testificaram essa verdade (vide Atos 5:31; Atos 13:38–39; Efésios 1:7), como também os profetas do Livro de Mórmon (vide Enos 1:5; Mosiah 4:3; Morôni 6:8) e dos tempos modernos (vide D&C 61:2).

Através dos séculos, muitos receberam grande alegria e paz de consciência por meio da compreensão e aceitação do perdão do Senhor. Muitos outros, porém, aparentemente continuam a carregar o fardo do pecado, remorso e dúvida devido a uma compreensão e testemunho incompletos da doutrina de Cristo.

Recentemente, tive uma conversa particular com uma pessoa que, depois de cometer uma transgressão séria, se esforçara arduamente por receber o perdão daqueles a quem ofendera pessoalmente, da Igreja e do Senhor. Quando perguntei: “Sente que foi perdoado pelo Pai Celestial?”, ele, hesitante, deu-me uma resposta afirmativa, porém limitada. “Como obtemos o perdão divino?” perguntei.

Ele contou-me como havia abandonado o comportamento pecaminoso do passado, confessado às devidas autoridades do sacerdócio e procurado fazer restituição àqueles que havia ofendido. Descreveu ainda seus esforços para viver de acordo com os princípios do evangelho e padrões da Igreja.

Não fez menção ao Salvador e seu sacrifício expiatório. Parecia presumir que o perdão divino é obtido através dos passos do arrependimento limitados à mudança de comportamento. Apesar dos esforços sinceros daquele irmão em arrepender-se, parecia ainda estar carregado de remorso e pesar, sentindo que devia continuar pagando pelos pecados cometidos.

Infelizmente, este não é um caso isolado. Sei de outras pessoas que ainda carregam o peso de erros passados, grandes e pequenos, devido a uma compreensão incompleta ou incorreta do plano de redenção e misericórdia de nosso Pai. Aqueles que carregam tais fardos podem estar enfrentando a vida desnecessariamente privados da alegria e paz de consciência que deveriam receber por meio do arrependimento verdadeiro e do perdão divino.

Aquele que acha que pode ou deve continuar pagando o preço de seus pecados, para assim alcançar o perdão divino, não se sentirá capaz de continuar progredindo rumo a seu potencial divino, ou seja, a vida eterna.

A verdade é que não podemos nos salvar a nós mesmos.

A melhor fonte para uma compreensão correta de como o perdão pode ser obtido é o Livro de Mórmon. Consideremos alguns exemplos de seus ensinamentos.

Enos registrou a experiência que teve, sozinho na floresta, ao lembrar-se das palavras de seu pai a respeito da vida eterna:

“E minha alma ficou faminta; ajoelhando-me ante o Criador, dirigi-lhe uma fervorosa oração, suplicando-lhe por minha própria alma;…

E veio-me uma voz, dizendo: Enos, teus pecados te são perdoados…

Portanto, minha culpa foi apagada.

E eu disse: Senhor, como isso se fez?

E ele me respondeu: Por tua fé em Cristo” (Enos 1:4–8).

Como isso se fez? Cada um de nós poderia meditar sobre essa pergunta. Voltemos novamente ao Livro de Mórmon para obtermos maior compreensão.

O pai Léhi nos ensina que o propósito divino de nossa provação mortal requer que experimentemos oposição em todas as coisas, discernindo o bem do mal, a fim de exercitar nosso livre-arbítrio, fazer escolhas e responder pelas conseqüências (vide 2 Néfi 2).

Aprendemos com o profeta Alma que estamos sob a lei divina, a qual todos transgredimos em maior ou menor grau, tornando-nos sujeitos às exigências da justiça (vide Alma 42:14,18). A justiça de Deus é baseada em leis divinas, segundo as quais recebemos o que merecemos, de acordo com a desobediência ou obediência à lei.

A justiça não concede perdão ao transgressor, mas exige que as penalidades sejam aplicadas (vide D&C 82:4). Ninguém está isento (vide D&C 107:84). Depois de tudo que pudermos fazer para nos arrependermos, ainda estaremos sujeitos às exigências da justiça e a suas penalidades, às quais não podemos satisfazer.

Entretanto, Alma nos ensina sobre o grande plano de misericórdia do Pai, pelo qual o Filho de Deus viria expiar os pecados do mundo e “satisfazer os requisitos da justiça, para que Deus seja um Deus perfeito, justo e também misericordioso” (Alma 42:15).

O sacrifício vicário do Salvador satisfaz a justiça de Deus. Desse modo, Deus estende-nos sua misericórdia para que possamos receber o perdão de nossas faltas individuais por meio de fé no Redentor, seguida de obediência às leis e ordenanças do evangelho.

O pai Léhi ensinou a seu filho Jacó:

“Portanto, a redenção só é obtida por intermédio do Santo Messias; porque ele é cheio de graça e verdade.

Pois que ele se oferece em sacrifício pelo pecado, satisfazendo assim as demandas da lei para todos os quebrantados de coração e contritos de espírito” (2 Néfi 2:6–7).

O início e o fim do arrependimento que leva ao perdão é fé em Jesus Cristo, que é o “autor e aperfeiçoador de {nossa} fé” (vide Morôni 6:4). Nossa fé em que ele é o Salvador e Redentor produz em nós um pesar divino por nossas transgressões, um coração quebrantado e um espírito contrito, além de uma sensação de responsabilidade pessoal. Segue-se uma mudança de atitude e um redirecionamento de nossa vida para Deus.

Tomamos a resolução de abandonar a desobediência, a negligência, e de procurar conhecer melhor e amar o Pai Celestial e obedecer a suas leis e mandamentos. Durante todo o processo, oramos pelo perdão de nosso Pai, por força para resistir às tentações e por inspiração para preencher nossa vida com tudo que existe de bom e agradável ao Senhor. Procuramos o perdão das pessoas a quem ofendemos e tentamos restituir tudo o que for possível.

Se nosso comportamento passado é de tal natureza que comprometa nossa condição de membro da Igreja, confessamos às autoridades eclesiásticas apropriadas e, se necessário, submetemo-nos à ação disciplinar da Igreja, que não tem o propósito de punir, mas de curar e renovar. Durante todo o processo do arrependimento, sentimos pesar, remorso e culpa, e sofremos com isso. Entretanto, nosso sofrimento individual não satisfaz às exigências da justiça que acompanham a desobediência à lei divina. Não podemos pagar o preço de nossos pecados.

O Cristo ressuscitado disse: “Pois eis que eu, Deus, sofri estas coisas por todos, para que arrependendo-se não precisassem sofrer” (D&C 19:16). Aos nefitas, ele declarou: “Não volvereis a mim, arrependendo-vos de vossos pecados e convertendo-vos, para que eu vos cure?” (3 Néfi 9:13; grifo nosso).

O perdão que o Senhor nos concede, entretanto, não é completo até ser aceito. O verdadeiro e completo arrependimento é um processo pelo qual podemos nos reconciliar com Deus e aceitar o divino dom do perdão.

Nas palavras de Néfi: “É pela graça que somos salvos, depois de tudo o que pudermos fazer” (2 Néfi 25:23).

O infinito sacrifício expiatório teve dois resultados: Primeiro, ressurreição e imortalidade para todos, sem restrições. Segundo, a vida eterna para todo aquele que cumpre as condições prescritas, que são: fé em Jesus Cristo, como Salvador e Redentor, e arrependimento.

Depois disso, devemos nos qualificar para receber as ordenanças de salvação e exaltação do evangelho, com seus respectivos convênios, perseverando continuamente na obediência a esses convênios e aos mandamentos de Deus.

Por sermos mortais, apesar de toda a nossa determinação e esforços, não alcançaremos a perfeição. Entretanto, como o antigo profeta Néfi, cônscios de nossa fraqueza, tentações e erros passados, podemos dizer: “Não obstante, sei em quem confiei” (2 Néfi 4:19). Surge assim a resolução natural de renovarmos nossos esforços.

Para recebermos o perdão divino é essencial que o reconheçamos e aceitemos a misericórdia do Pai, que foi colocada ao nosso alcance pelo sacrifício expiatório de Jesus Cristo, e que também renovemos o convênio que fizemos de obedecer aos princípios do evangelho.

Exemplos desse processo e seus resultados podem ser encontrados no Livro de Mórmon. Depois de aprender sobre a doutrina da Expiação, o povo do rei Benjamim, cônscio de suas transgressões passadas, implorou misericórdia, para que, por meio do sangue expiatório de Cristo, pudessem receber o perdão dos pecados, pois, disseram eles: “cremos em Jesus Cristo, o Filho de Deus…

E… sobre eles desceu o Espírito do Senhor e os encheu de alegria, tendo recebido a remissão de seus pecados, e tendo paz de consciência, por causa da profunda fé que tinham em Jesus Cristo” (Mosiah 4:2–3).

Cada um de nós pode perguntar: “Como posso saber que fui perdoado?”

Tendo completado os passos do arrependimento e confiando na graça e misericórdia de Deus, é natural que prestemos testemunho do Salvador e de seu sacrifício expiatório e procuremos ser um exemplo.

O Élder Bruce R. McConkie, apóstolo de Jesus Cristo, proferiu as seguintes palavras de conforto:

“A relação entre o testemunho prestado pelo poder do Espírito Santo e o perdão dos pecados ilustra uma gloriosa verdade do evangelho. Sempre que um santo fiel recebe a companhia do Espírito Santo, torna-se limpo e puro diante do Senhor, pois o Espírito não habita em tabernáculos impuros. Desse modo, ele recebe uma remissão dos pecados que cometeu depois do batismo” (The Mortal Messiah: From Bethlehem to Calvary, 4 vols., Salt Lake City: Deseret Book Co., 1980, 3:40–41, n° 1).

O ponto central do evangelho é o sacrifício vicário do Salvador, que satisfaz à justiça divina e torna eficaz a misericórdia de Deus, resultando na ressurreição universal e incondicional e na possibilidade de vida eterna para todo aquele que aceitar Jesus Cristo como Redentor e obedecer aos princípios, ordenanças e convênios do evangelho.

O antigo profeta Isaías ensinou-nos: “Cessai de fazer mal.

Aprendei a fazer bem…

Ainda que vossos pecados sejam como a escarlata, eles se tornarão brancos como a neve” (Isaías 1:16–18).

E mais: “Verdadeiramente ele tomou sobre si as nossas enfermidades, e as nossas dores…

Ele foi ferido pelas nossas transgressões, e moído pelas nossas iniqüidades: o castigo que nos traz a paz estava sobre ele, e pelas suas pisaduras fomos sarados” (Isaías 53:4–5).

O profeta desta dispensação, Joseph Smith, e seu companheiro, Sidney Rigdon, deram testemunho do evangelho, como registrado na seção 76 de Doutrina e Convênios. Cada um de nós pode receber semelhante testemunho espiritual; portanto, sugiro que expressemos o testemunho deles como se fosse o nosso, nas seguintes palavras:

“E este é o evangelho…

Que ele veio ao mundo, Jesus mesmo, para ser crucificado por [mim], para carregar os [meus] pecados…, e para [santificar-me] e [purificar-me] de toda a iniqüidade;

Para que por intermédio dele [eu pudesse] ser [salvo]” (D&C 76:40–42).

Para concluir, cito os seguintes versos de um de meus hinos favoritos:

Com sábio e terno amor

Nos rege nosso Pai.

Trazei os fardos ao Senhor,

Em seu amor confiai…

Não há de nos vencer

A dura provação

Do trono do real poder

Virá consolação.

Desvelo e compaixão

Demonstra nosso Rei.

Meu fardo deixo em sua mão

E alegre seguirei.

(Hinos, n° 47)

Presto solene testemunho pessoal das verdades que procurei ensinar, no sagrado nome de nosso Senhor e Salvador, Jesus Cristo. Amém.